Posts Tagged ‘Sofia’

TUTAMÉIA, Guimarães Rosa

março 16, 2011

Mas.
Sempre vem imprevisível o abominoso? Ou: os tempos se seguem e parafraseiam-se.

O HOMEM QUE QUERIA SER REI, Rudyard Kipling

outubro 28, 2010

Este contrato entre mim e você dá testemunho em nome de Deus. Amém e assim por diante:
(Um)     Que eu e você vamos entrar neste negócio juntos, isto é, vamos ser reis do Kafiristão.
(Dois)    Que você e eu, enquanto este negócio estiver sendo resolvido, não vamos olhar para nenhuma Bebida, nem para nenhuma Mulher preta, branca ou mestiça, pois se meter com uma e outra é prejudicial.
(Três)     Que vamos nos conduzir com Dignidade e Discrição, e se um de nós se meter em confusão o outro responde por ele.
Assinado neste dia por você e eu.
Peachey Taliaferro Carnehan.
Daniel Dravot.
Dois cavalheiros decentes.

DENTRO DA NOITE VELOZ, Ferreira Gullar

agosto 16, 2010

Cantada

Você é mais bonita que uma bola prateada
de papel de cigarro
Você é mais bonita que uma poça dágua
límpida
num lugar escondido
Você é mais bonita que uma zebra
que um filhote de onça
que um Boeing 707 em pleno ar
Você é mais bonita que um jardim florido
em frente ao mar em Ipanema
Você é mais bonita que uma refinaria da Petrobrás
de noite
mais bonita que Ursula Andress
que o Palácio da Alvorada
mais bonita que a alvorada
que o mar azul-safira
da República Dominicana

Olha,
você é tão bonita quanto o Rio de Janeiro
em maio
e quase tão bonita
quanto a Revolução Cubana

NOTAS DE UM VELHO SAFADO, Bukowski

agosto 13, 2010

tenho visto intelectuais demais ultimamente. me canso fácil dos preciosos intelectos que precisam cuspir diamantes toda vez que abrem as suas bocas. eu me canso de ficar batalhando por cada espaço de ar para o espírito. é por isso que me afasto das pessoas por tanto tempo, e agora que estou encontrando as pessoas, descubro que preciso voltar pra minha caverna. existem outras coisas além da mente: há insetos e palmeiras e trituradores de pimenta, e eu vou ter um triturador de pimenta na minha caverna, portanto riam.

EL HÉROE DE LAS MUJERES, Adolfo Bioy Casares

julho 22, 2010

Cundo cumplió veintiún años, en febrero de 1930, su madre le dijo con la formalidad que pedía la ocasión:
– Desde hoy sos un hombre. Si tu voluntad es ir al pueblo, no voy a estorbarla. Eso sí: todo que puedo darte es mi bendición, un consejo y una carta para don Leopoldo.
Redactada por la mayor de las muchachas, que había estudiado para maestra normal, la carta iba dirigida al consignatario don Leopoldo Medina, a quien llamaba “Mi compadre”, y contenía el pedido de “ver de conchabar mi hijo Luis, portador de la presente, en su prestigiosa casa de remates y feria”.
Luisito preguntó:
– Y el consejo?
– Prudenciar, hijo mío. En el pueblo abunda el malandrín.

AS HORAS NUAS, Lygia Fagundes Telles

julho 21, 2010

Se enlouquecesse podia ser uma solução, não preciso morrer, apenas enlouqueço, não conheço mais ninguém, não me conheço, esqueci. Uma louca limpa, sem o ranho escorrendo, sem a baba. Como sou rica posso escolher a cidade que quiser, exijo uma cobertura onde possa ficar horas e horas olhando o horizonte. Olhando o mar, acho que o Rio é a cidade ideal para os loucos contemplativos, sou uma louca contemplativa.

NOTAS DE UM VELHO SAFADO, Bukowski

julho 20, 2010

Prefácio

É mais divertido e mais perigoso trabalhar para o OPEN CITY, provavelmente o farrapo mais vivo dos EUA. Mas divertimento e perigo dificilmente passam margarina na torrada ou alimentam o gato. Você desiste da torrada e acaba comendo o gato.

O AMANTE, Marguerite Duras

julho 19, 2010

O que acontece é justamente o silêncio, esse lento trabalho de toda a minha vida. Ainda estou lá, na frente daquelas crianças possessas, à mesma distância do mistério. Jamais escrevi, acreditanto escrever, jamais amei, acreditando amar, jamais fiz coisa alguma que não fosse esperar diante da porta fechada.

MADAME BOVARY, Gustave Flaubert

julho 14, 2010

Alguns homens (uns quinze), de vinte e cinco a quarenta anos, disseminados entre os pares ou conversando à entrada das portas, distinguiam-se da multidão por um ar de família, fossem quais fossem as diferenças de idade, de trajes ou de figura.
Suas casacas, mais bem cortadas, pareciam feitas de um tecido mais macio, e seus cabelos, puxados em caracóis em direção às têmporas, pareciam brilhar com uma pomada mais fina. Possuíam a tez da riqueza, aquela tez branca realçada pela palidez das porcelanas, pelo reflexo dos cetins, pelo verniz dos belos móveis e cuja saúde é mantida por um regime discreto de alimentos requintados. Seus pescoços movimentavam-se à vontade sobre suas gravatas baixas, suas longas suíças caíam sobre colarinhos voltados; enxugavam os lábios com lenços bordados com um grande monograma e de onde saía um aroma suave. Os que começavam a envelhecer tinham um ar jovem, enquanto alguma coisa de maduro espalhava-se no rosto dos jovens. Em seus olhares indiferentes flutuava a quietude das paixões diariamente saciadas – e, por meio de suas maneiras suaves, despontava aquela brutalidade particular que confere o domínio de coisas semifáceis nas quais a força age e a vaidade se diverte -, o manejo dos cavalos de raça e a convivência com mulheres perdidas.

O CEGO E A DANÇARINA, João Gilberto Noll

julho 5, 2010

Não chove há um ano e meio. A terra em volta se cresta. Há um sensacionalismo nordestino nessa terra assim ferida, mas a mulher e o adolescente ignoram qualquer Nordeste. E no entanto são atingidos. Tão atingidos que a mulher pensa que dança mas está apenas aturdida por vermes e o adolescente pensa que olha uma mulher que deseja mas de fato olha a mancha suada que dança na sua quase cegueira.